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Plantas Psicoativas: uma abordagem Interdisciplinar

Saúde e bem-estar

Plantas Psicoativas: uma abordagem Interdisciplinar

esfitz
Escrito por esfitz em 25/03/2024

Discussão sobre a Terminologia

A expressão “plantas psicoativas” pode gerar discussões devido à sua associação com drogas de abuso.

Essa polêmica surge devido à diversidade de terminologias e à falta de análise criteriosa.

Portanto, é importante considerar as definições da Organização Mundial de Saúde (OMS) para esclarecer a intenção por trás do uso do termo “plantas psicoativas”.

Segundo a OMS, a “droga psicoativa” modifica o comportamento e os processos cognitivos, afetando o sistema nervoso central.

Já a definição de “droga psicotrópica”, além de afetar o comportamento e os processos cognitivos, inclui uma propriedade reforçadora.

Isso significa que causam efeitos que reforçam o uso contínuo, o que pode levar à dependência devido ao uso repetido.

Portanto, plantas psicoativas são aquelas espécies vegetais que interferem de alguma forma em processos relacionados à:

  • atividade mental,
  • comportamento (como o controle das emoções ou a regulação do sono, por exemplo),
  • humor e
  • processos cognitivos, como aprendizagem e memória.

Embora haja diversas discussões sobre a terminologia mais apropriada, vamos utilizar a expressão “planta psicoativa” com base na primeira definição da OMS, conforme mencionado anteriormente.

O objetivo é ressaltar os efeitos das plantas no funcionamento mental, comportamental e cognitivo, além de compreender seus mecanismos de ação.

Essas plantas, que têm o poder de alterar o funcionamento da mente, têm fascinado os seres humanos desde os primórdios da história.

ANTECEDENTES HISTORICOS

Para muitas culturas ao redor do mundo, as plantas psicoativas tem um significado místico e religioso.

De fato, podemos dizer que muitas sociedades tradicionais basearam sua estrutura social e cultural no uso de certas plantas com propriedades psicoativas.

Um exemplo é a relação entre os povos dos altiplanos andinos e a coca, ou entre os índios norte-americanos e o peiote, entre outros casos.

Nessas sociedades, o conhecimento sobre as plantas, especialmente as psicoativas, influenciou a organização social.

Os verdadeiros guardiões do conhecimento tradicional relacionado as plantas são curandeiros, ervateiros, pajés ou xamãs.

ACOMPANHAMENTO AO LONGO DA HISTORIA

Estudos arqueológicos sugerem que várias espécies psicoativas foram utilizadas por humanos e seus ancestrais em tempos pré-históricos, com uma ampla distribuição geográfica de uso.

Além disso, evidências históricas confirmam a importância significativa dessas plantas em certas comunidades sociais e culturais.

Assim, uma planta psicoativa poderia ter múltiplos usos, como:

  • alimento,
  • proteção,
  • facilitação da caça e pesca,
  • comunicação,
  • ornamento cultural ou hierárquico, e
  • rituais de cura.

Parece altamente provável que as plantas psicoativas tenham sido uma presença constante ao longo da jornada humana neste planeta, talvez até mesmo influenciando ou guiando os passos dos próprios humanos.

INTERDISCIPLINARIEDADE NO ESTUDO

O estudo das plantas psicoativas requer uma abordagem interdisciplinar, envolvendo profissionais de diversas áreas, como:

  • antropologia,
  • botânica,
  • farmacologia e
  • ecologia.

O objetivo dessa integração é compreender de maneira abrangente o significado da planta tanto em termos socioculturais quanto em termos biológicos.

Uma única espécie vegetal pode fornecer uma ampla gama de informações, tais como:

  • O contexto social e cultural no qual ela é utilizada, incluindo se é ritualizada, se há hierarquias associadas ao seu uso, se é igualmente usada por homens e mulheres, e como a comunidade percebe esse recurso;
  • As lendas e mitos que cercam seus usos e efeitos;
  • Os nomes populares que recebe, os quais variam de acordo com a região;
  • Sua nomenclatura científica, que permite identificá-la corretamente em qualquer lugar do mundo;
  • Os dados botânicos e agronômicos da espécie, incluindo suas características visuais e microscópicas, flores, colorações, tamanho da planta, climas nos quais cresce e condições de cultivo;
  • As diferentes formas tradicionais de uso pela população, para quais finalidades, em que circunstâncias, para quais condições de saúde, como é preparada, a quantidade utilizada e quais partes são utilizadas;
  • A composição química de suas partes, incluindo as substâncias presentes, suas classes químicas, métodos de extração e otimização da obtenção dessas substâncias.
  • A farmacologia dessas plantas, incluindo seu modo de ação no organismo, os mecanismos envolvidos, os sistemas orgânicos afetados, os efeitos adversos e os efeitos positivos;
  • Outras classes de informações que podem ser obtidas por meio do estudo de uma espécie vegetal psicoativa.

Nesse contexto, a colaboração de diversos profissionais com formações acadêmicas variadas é essencial, e a integração entre eles é fundamental para uma compreensão abrangente da importância das plantas psicoativas em um contexto amplo.

A RELEVANCIA NO CONTEXTO BRASILEIRO

No caso específico do Brasil, o estudo das plantas psicoativas assume uma relevância ainda maior devido a vários fatores:

  • A vasta diversidade biológica do país, que o coloca como líder mundial em número de espécies vegetais, sendo um verdadeiro banco genético de espécies.
  • A presença de numerosas espécies vegetais endêmicas, encontradas apenas no território brasileiro.
  • A existência de biomas distintos e ricos em biodiversidade vegetal, como a Mata Atlântica, os Campos Sulinos, o Pantanal, o Cerrado, a Caatinga e a Amazônia.
  • A diversidade cultural, resultado da multiplicidade étnica do país, desde comunidades indígenas até descendentes de imigrantes de diversas partes do mundo. Essa riqueza étnica influenciou profundamente o conhecimento e o uso de plantas psicoativas ao longo da história do Brasil.

A interação entre a diversidade de povos e origens é tão importante quanto a diversidade biológica do país.

A influência de diferentes culturas sobre o conhecimento botânico resultou em uma riqueza etnobotânica inigualável, fornecendo uma fonte inesgotável de informações sobre o uso de plantas que afetam o funcionamento da mente.

ESTUDOS E ADVERTÊNCIAS

Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo, liderado pela pesquisadora Eliana Rodrigues, investigou quais plantas com possíveis efeitos sobre o sistema nervoso central eram usadas popularmente no Brasil, com base em fontes históricas dos séculos XVI ao XIX.

As pesquisadoras utilizaram livros históricos encontrados em instituições reconhecidas no Brasil, como as bibliotecas da Universidade de São Paulo e do Instituto Botânico do Estado de São Paulo, para identificar as plantas mencionadas por seus efeitos sobre o sistema nervoso central.

Os resultados do estudo são fascinantes:

Foram encontradas 93 plantas mencionadas por seus efeitos sobre o sistema nervoso central, incluindo espécies amplamente conhecidas no Brasil, como caju (Anacardium occidentale), mandioca (Manihot utilissima), guaraná (Paullinia sp) e cacau (Theobroma sp).

Dessas 93 plantas, 34 espécies eram nativas do Brasil, representando mais de 35% do total de plantas mencionadas.

Isso destaca a importância do Brasil como um banco de espécies vegetais, especialmente de espécies vegetais psicoativas.

É importante considerar que há uma falsa crença, muitas vezes perpetuada pela mídia, de que as plantas não causam efeitos adversos por serem de fonte natural.

Frases como :

  • “pode usar que não tem problema, é natural”,
  • “o que é natural é bom”, ou
  • “não tem compostos químicos, é natural”..

…são exemplos dessa falácia, especialmente quando se trata do uso de plantas.

No entanto, é crucial compreender que as plantas podem ser tão tóxicas e perigosas quanto os compostos de origem sintética, quando mal utilizadas ou empregadas de maneira equivocada.

Neste contexto, um trabalho divulgado em 2005 apresenta uma lista de efeitos adversos que podem ocorrer em virtude do uso de determinadas espécies vegetais, tais como fotodermatite pelo uso da ervade-São-João ou da angélica (Hypericum perforatum e Angelica archangelica, respectivamente), distúrbios hepáticos pelo uso do mate (Ilex paraguariensis) ou desconforto abdominal pelo uso de sene
(Cassia augustifolia), entre outros efeitos.

Outra pesquisa, conduzida em 1999, também ressalta a importância de uma abordagem cautelosa em relação ao uso de plantas bioativas.

Este estudo analisou o número de casos, óbitos e índice de letalidade por intoxicação registrados em centros de controle de intoxicações humanas no Brasil durante o período de 1993 a 1996.

Segundo os autores, nesses três anos, houve 5.862 casos de intoxicações causadas pelo uso de plantas, resultando em 31 óbitos, o que representa um índice de letalidade de 0,53%.

Embora esse número possa parecer insignificante quando comparado aos 57.548 casos de intoxicações causadas por medicamentos convencionais no mesmo período, é crucial considerar que, desses casos, ocorreram 266 óbitos, com um índice de letalidade de 0,46%, ligeiramente menor do que o índice de letalidade por intoxicações com plantas.

Esses dados enfatizam a importância de tratar o uso de plantas bioativas com a mesma cautela e parcimônia que se dedica a qualquer outro tipo de composto bioativo sintético, visando preservar a integridade física do organismo.

CONCLUSÃO

Em suma, o estudo das plantas psicoativas é crucial e demanda colaboração entre diversos profissionais.

Diante da vasta diversidade biológica e cultural do Brasil, a compreensão dessas plantas se torna ainda mais relevante.

Contudo, é essencial reconhecer os potenciais riscos associados ao seu uso, destacando a necessidade de abordagens cuidadosas e informadas.

Ao refletir sobre o legado ancestral e a complexa relação entre humanos e plantas, surge um convite para uma exploração mais profunda e responsável desses recursos naturais, em busca de um equilíbrio entre os benefícios terapêuticos e os cuidados com a saúde.

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One Reply to “Plantas Psicoativas: uma abordagem Interdisciplinar”

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